Linha do Vale do Vouga abriu há 100 anos

Inaugurada pelo último Rei de Portugal, a Linha do Vale do Vouga já foi a ligação mais importante da região. De S. João da Madeira partiam tantas mercadorias que o comboio tinha que voltar atrás para ganhar lanço.
Imagem: Inauguração da Linha, revista "Ilustração Portuguesa"
“Cerca de 20.000 pessoas acorreram à Vila da Feira para aplaudir El-Rei D. Manuel II, na inauguração do troço entre Espinho e Oliveira de Azeméis, da Linha do Vale do Vouga”, escreveu o Correio da Feira, na edição de 28 de Novembro de 1908. O momento é recordado na “Monografia do Vale do Vouga”, publicada pela Comissão Organizadora do 75.º aniversário da linha em 1983.
Naquele dia de 23 de Novembro de 1908, D. Manuel II chegou a Espinho de manhã. A aguardá-lo estavam muitos populares e todas as autoridades do momento, entre as quais o Bispo-Conde de Coimbra, D. Manuel Luiz Coelho da Silva. Depois de um banquete no salão nobre da Câmara Municipal de Espinho, procedeu-se à inauguração da via e à primeira viagem.

O comboio era composto pela máquina n.º 12, duas carruagens para convidados e salão real. Tudo material dos Caminhos de Ferro de Vila Real, dado o atraso da encomenda para o Vale do Vouga que ainda não tinha chegado.
Seguiu para Oliveira de Azeméis, efectuando algumas paragens no percurso para que as populações pudessem aclamar o rei.

Estação de São João da Madeira era das mais movimentadas

Fontes antigas afirmavam que a estação de S. João da Madeira era, em 1930, aquela com mais tráfego, depois de Aveiro e Espinho. N’”O Regional” de Outubro de 1931 dizia-se que “o caminho de ferro do Vale do Vouga mantinha diariamente em circulação um vagão destinado exclusivamente ao transporte de mercadorias de S. João da Madeira, o qual nem sempre satisfazia as necessidades do tráfego”, por escassa que era a sua capacidade. Diariamente a indústria via-se obrigava a recorrer à estações de Arrifana e Ovar para expedir grande parte das suas mercadorias, o que acabaria por motivar a ampliação do cais, por duas vezes.

Conta Belmiro António da Silva que, com o peso da mercadoria, o comboio “muitas vezes não vencia de uma assentada a ladeira do Carregal que se situa a muito pequena distância da estação”. “Tal espectáculo – o do comboio voltar atrás para ganhar forças e novamente arrancar a todo o vapor – servia de gáudio à rapaziada do meu tempo que delirava de prazer com o insucesso da locomotiva”, recorda.

Antes do Facebook, era o Vouguinha...

Mas o comboio motivava também a criação de redes sociais. Na década de 20, os jovens acudiam à estação do caminho de ferro aos domingos e feriados, “ali passeando e galanteando no recinto de espera”, “para verem e serem vistos, eles e elas, nas suas garridices que eram apanágio da sua idade jovem”. “Belos e saudosos tempos”, conclui Belmiro António da Silva, em tom de lamento.

Locomotiva descarrilou no primeiro dia

Entre os vários testemunhos inscritos na “Monografia do Vale do Vouga”, Álvaro Pereira é quem vai mais atrás. Conta que em 1867, a abertura da linha de caminhos de ferro no lanço de Gaia a Aveiro nem sequer considerava Espinho como paragem. Só depois foi depois criada uma pequena paragem, com uma simples casa da guarda, que passou a apeadeiro e, no ano de 1875, foi, finalmente, inaugurada uma estação.

Mas Espinho carecia de uma ligação com a Beira, já que várias personalidades daquela região procuravam a sua praia na época balnear. Entre muitos, o Bispo de Viseu, D. António Alves Martins, e o Engenheiro Bandeira Coelho, que era de Vouzela e foi Director das Estradas de Aveiro.

A concessão para a Linha do Vale do Vouga foi finalmente notícia em 1889. Inaugurava a 23 de Novembro de 2008, mas só a 21 de Dezembro do mesmo ano entrou em exploração efectiva.

Sobre esse primeiro dia de abertura ao público, Manuel Tavares relata no mesmo livro um episódio curioso. “A máquina que devia puxar o comboio das 13h30, a sair de Oliveira de Azeméis, descarrilou ao ser voltada, e a máquina substituta, indo de Espinho, descarrilou perto de Cucujães. Assim, ficou cancelado, nesse dia, o serviço de comboios”.

Em 1911 abriu-se o ramal de Aveiro a Sernada e em 1913 a linha é alargada até Viseu, e daí para Santa Comba Dão, onde ligava à Linha da Beira Alta, passando a ter uma extensão de 140 mil quilómetros. Este ramal esteve sem tráfego desde o início da década de 1970 até 1974, sendo definitivamente encerrado em 1990. Hoje, a ligação de Sernada do Vouga a Oliveira de Azeméis está praticamente desactivada.

Depois de 1930 pouco se fez, lê-se na monografia. “A Salazar pouco interessava o desenvolvimento das comunicações”, afirma Ginestal Machado, vogal da Comissão de Museus Ferroviários em 1983.

Por: Anabela S. Carvalho
Editado por: Movimento Cívico pela Linha do Vouga
Arquivo labor.pt: Edição de 06-11-2008

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